15 de mar. de 2011

Não existe consumo seguro

Preconceito, desinformação e moralismo dificultam a conscientização sobre riscos do vício entre os jovens.
De cada dez universitários brasileiros, apenas um nunca experimentou drogas lícitas ou ilícitas, segundo estudo da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad). “No Brasil, a discussão sobre o assunto sempre foi pouco esclarecida, carregada de preconceito, desconhecimento e avaliação moral”, lamenta Paulina do Carmo Arruda Vieira Duarte, secretária adjunta da Senad.
Uma comprovação: poucas instituições de ensino têm consolidado um programa antidrogas. De 100 universidades, 53 promovem eventos pontuais ou campanhas, e apenas 28 incluem o tema em seu projeto pedagógico. “Embora existam evidências de que experiências com drogas lícitas e ilícitas ocorram dentro dos campi, a presença de programas antidrogas não se configura como uma exigência legal do sistema de ensino, e sua existência depende apenas da vontade política e pedagógica das instituições”, conclui Márcia Rodrigues Garcia Tamosauskas, chefe do departamento de Patologia da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC).
Seja pela falta de empenho das escolas ou pelo caráter contestador dos jovens, o uso das drogas está arraigado e provoca graves consequências, como maior incidência de comportamentos de risco e de doenças psiquiátricas – aqui incluídas as drogas lícitas, em especial as bebidas alcoólicas. As análises de Paulo Jannuzzi Cunha, pesquisador do Programa Equilíbrio do Instituto de Pesquisas do Hospital das Clínicas de São Paulo/SP, concluem que “não existe padrão seguro e saudável para o consumo de álcool relacionado ao trânsito e ao dirigir”, pois uma simples dose de bebida aumenta em quatro vezes a chance de o jovem aceitar carona de um motorista embriagado.
Além disso, o álcool funciona como uma porta de entrada para outras drogas, fato admitido por 43% dos entrevistados. “À medida que o uso múltiplo se torna um hábito regular, chega-se ao ponto em que o usuário se vê enredado num ciclo vicioso, no qual o desejo por uma substância leva ao consumo de outras”, observa Lúcio Garcia de Oliveira, pós-doutorando pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. O perigo, além da dependência físico-psicológica, é a interação das drogas, fato pouco veiculado fora da literatura especializada. É o caso do cocaetileno, substância extremamente tóxica gerada no organismo quando a cocaína se associa ao álcool. Ao potencializar os efeitos do pó nos sistemas cardiovascular e nervoso central, a mistura pode causar convulsões, danos hepáticos e enfraquecimento do sistema imunológico (ver quadro).

CIEE em campanha.
Por todos esses motivos, ações como a da Campanha Nacional Antidrogas nas Escolas Superiores, programa coordenado pelo CIEE por delegação da Senad, têm importância redobrada. É composta por três pilares: a publicação de folders informativos elaborados por especialistas e distribuídos a estudantes, a promoção de um concurso anual de monografia e a realização de seminários em campi, sempre a convite de instituições de ensino. Em 2011, esse ciclo de palestras ministradas por educadores e especialistas, até então restrito majoritariamente à capital paulista, será levado a outros estados.
Neste ano, já foram realizados dois seminários no estado paulista – um no campus da Faculdade Anhanguera, em Taboão da Serra, e outro na Uniban de Osasco. “Discutimos o assunto com perspectiva isenta, caráter científico e sem levar em conta interesses econômicos que distorcem a cobertura da mídia tradicional”, diz Ana Regina Noto, professora da disciplina Medicina e Sociologia do Abuso de Drogas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), colunista especializada de Agitação e organizadora das palestras nas universidades.
No ano passado, aproximadamente dois mil universitários participaram dos encontros. Além disso, o CIEE apoia ações antidrogas promovidas por outras organizações. Um exemplo é a participação do CIEE, em reunião pra alinhavar parceria com a Comissão de Estudos sobre Educação e Prevenção de Drogas e Afins da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São Paulo (OAB-SP), presidida por Cid Vieira de Souza Filho, e apoiada por várias entidades.
Fonte: Revista Agitação nº 98, de Março e Abril de 2011.

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