País tem 1,3 milhão de viciados em maconha
2º Levantamento Nacional de Álcool e Drogas ouviu
4.067 pessoas; número de jovens que admitiu usar a droga preocupa
Estudo usou cinco critérios para definir
dependência, entre eles a sensação de perda de controle sobre o uso
Carlos tem 18 anos e é estudante de arquitetura.
Começou a fumar maconha há dois anos. Tentou parar três vezes e não conseguiu.
Só de pensar em ficar sem seu "baseado"
diário, começa a se sentir ansioso e "um pouco" fora de controle,
disse.
"Me dá uma agonia gigantesca. Fico até mais
irritado do que o normal", afirmou o estudante, que pediu para não ter o
sobrenome divulgado.
Assim como ele há cerca de 1,3 milhão de
brasileiros dependentes de maconha, de acordo com o 2º Levantamento Nacional de
Álcool e Drogas. O primeiro estudo, de 2006, não levantou o grau de dependência
do usuário.
O trabalho foi feito por pesquisadores da
Universidade Federal de São Paulo e do Inpad (Instituto Nacional de Ciência e
Tecnologia para Políticas Públicas do Álcool e Outras Drogas), com
financiamento do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico), do governo federal.
Para chegar aos números, cerca de cem pesquisadores
fizeram, de janeiro a março deste ano, entrevistas domiciliares com 4.067
pessoas em 149 cidades de todas as unidades da Federação. O resultado mostrou
que há 1,5 milhão de jovens e adultos que usam maconha todos os dias.
Isso não quer dizer que todos esses usuários são
viciados. "Pessoas que usam diariamente não são necessariamente
dependentes. Assim como dependentes não precisam usar todo dia para o
serem", afirmou a coordenadora do trabalho, a psicóloga Clarice Sandi
Madruga.
A pesquisa usa cinco critérios para considerar se a
pessoa é dependente ou não: 1) ansiedade por não ter a droga; 2) sensação de
perda de controle sobre o uso; 3) preocupação com o próprio uso; 4) ter tentado
parar; e 5) achar difícil ficar sem a droga.
JOVENS
Os dados, divulgados ontem, trazem uma informação
considerada preocupante pelos formuladores do trabalho: o número de jovens que
admitiu consumir a droga.
Em 2006, a cada adulto que consumia a droga havia
também um jovem. Neste ano essa proporção foi de um adulto para 1,4
adolescente.
"Nos surpreendeu assim como o número de
dependentes. Se tivesse que chutar, diria que 20% desses usuários eram
dependentes, e não 37%, como mostrou a pesquisa", diz o psiquiatra Ronaldo
Laranjeira, diretor do Inpad.
Além disso, 62% afirmaram que consumiram maconha
antes dos 18 anos.
Para Laranjeira, o levantamento serve para mostrar
que a maconha vicia assim como outras drogas e, por isso, merece atenção do
governo, principalmente no combate ao uso dela por adolescentes.
"Há pesquisas que mostram que um a cada dez
jovens que consomem maconha terão, no futuro, transtornos psiquiátricos",
disse.
O estudo mostrou que 75% dos brasileiros são contra
a legalização da maconha, 11% são a favor e os demais não souberam (9%) ou não
quiseram responder (5%).
Frases
"Sou a favor de descriminalizar o usuário da
maconha. Ela tem um potencial de dependência baixo. É menor do que o do álcool,
que é legalizado"
DARTIU XAVIER
psiquiatra, professor da Unifesp
"Legalizar a maconha não é o mais correto. Não
podemos deixar uma minoria decidir pela maioria"
RONALDO LARANJEIRA
psiquiatra, professor da Unifesp
"Tem muita gente séria dizendo ser a favor da
legalização. Já fui contra, mas agora sei que temos de debater essa
questão"
ARTHUR GUERRA DE ANDRADE
psiquiatra, professor da USP
Depoimento
'97% da população deveria calar a boca', diz Zé
Celso
Para o dramaturgo e criador do Teatro Oficina, José
Celso Martinez Corrêa, a proibição do uso da maconha implica gangsterismo. Leia
seu depoimento.
"Fiquei surpreso! Somente uma elite de 3% do
Brasil fumou maconha no último ano?! Logo, 97% deveriam calar a boca, pois têm
preconceito, mas nunca experimentaram.
Fumo desde 1968. Estou com 75 anos. Acordo, fumo um
e tomo guaraná em pó.
É absurdo que 3% da população já tenha fumado e
foram armados exércitos para combatê-la... Proibição implica
gangsterismo."
(MORRIS KACHANI)
Fonte: reportagem de Afonso Benites publicada na Folha de São Paulo, de 02/08/2012.